Perspectivas tributárias das eleições
02/09/2014Fonte: Valor Econômico | 02.09.2014
Por Edison Fernandes
Assisti ao primeiro debate com os candidatos à presidência com a expectativa de ouvir alguma coisa sobre a reforma tributária. O tema até foi tocado por alguns dos candidatos, mas os comentários foram genéricos, como têm sido e como, talvez, tenha sido inevitável nesse fórum. O debate não é o lugar nem há espaço para um detalhamento de proposta de reforma tributária.
Mesmo assim, a análise das três principais candidaturas, bem como dos assessores mais próximos de cada uma, possibilita que sejam traçadas algumas perspectivas tributárias do governo federal que assumirá em 1° de janeiro de 2015. Obviamente, as conclusões que serão apresentadas aproximam-se de um exercício de futurologia, porém, com alguma base empírica.
O ponto mais interessante nessa análise é a radical mudança de perspectiva. Normalmente, os candidatos de oposição geram certa insegurança, e até mesmo desconfiança, porque não seriam conhecidos. Nas próximas eleições, ao contrário, os oposicionistas já deixaram conhecer os seus assessores econômicos, o que contribui com a previsibilidade do governo de cada qual. A candidata de situação, por seu turno, é a incerteza dessa eleição, impedindo uma análise mais objetiva do que será a condução tributária a partir do próximo ano.
Tendências neutras:
Podem ser identificadas duas tendências na área da tributação que independem de quem será o futuro Presidente da República. Por esse motivo, são tendências neutras, que muito provavelmente ocorrerão no próximo governo. São elas: manutenção da carga tributária e aumento dos controles eletrônicos na área da tributação.
Por mais que haja mudanças pontuais na legislação tributária – e elas devem acontecer – a carga tributária deve ser mantida, ou, pelo menos, a média histórica recente. A manutenção da carga tributária pode vir a ser compensada com a melhoria nos serviços públicos ou no investimento, dependendo da pessoa que for eleita para a chefia do Poder Executivo federal.
Além disso, os controles eletrônicos na área da tributação, especialmente o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), tendem a evoluir. A herança representada por esse controle e a estrutura já montada deve ser preservada, quem quer que seja escolhido pelo voto. E mais do que isso, é muito provável que o processo evolutivo continue, melhorando tais controles.
Política tributária:
Embora seja uma característica constante (quase inata), num passado recente, desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, a política tributária tem sido pautada pela arrecadação, sob o apanágio: tributo serve para gerar receita para o Poder Público. Esse posicionamento foi confessado pelo ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, quando afirmou que a sua função era garantir a arrecadação, e não cuidar da aplicação dos recursos (e, nesse sentido, controlar as despesas públicas).
Essa postura deve ser combatida, no sentido de que a política tributária está inserida, como parte indissociável, da política econômica, e deve ser conduzida para atingir os objetivos determinados pela visão estratégica do governo. Estudos recentes da doutrina tributária valorizam a função indutora do tributo, ou seja, a sua utilização para fins extrafiscais.
Avaliando os assessores econômicos dos candidatos, arriscaria dizer que a integração da política tributária à política econômica pode vir a ser realidade nos governos de Marina Silva (Eduardo Gianetti da Fonseca e André Lara Resende) e de Aécio Neves (Armínio Fraga já anunciado como seu ministro da Fazenda). Isso porque, em ambos os casos, a política econômica parece ser pensada de uma maneira mais ampla, sem privilegiar setores específicos (o que reduzira as concessões de incentivos fiscais pontuais), além do que, também parece, seria reduzido o tamanho do estado brasileiro (principalmente no que diz respeito às despesas correntes).
Já no caso da reeleição de Dilma Rousseff, a condução da política tributária é uma incógnita: será mantido o atual espírito arrecadador, para fazer frente ao aumento dos gastos públicos? Ou, após o aprendizado do primeiro mandato, a política tributária será colocada a serviço do crescimento econômico?
Tamanho do estado:
A definição da política tributária está intimamente ligada ao tamanho do estado. Nesse tema, o tucano e a socialista-redista devem promover um enxugamento do aparelho estatal, inclusive por meio de concessões e privatizações. Com isso, há mais margem de manobra na condução da política tributária: de um lado, a menor pressão por receitas públicas (arrecadação) e, de outro, o aumento da base tributária, na medida em que a iniciativa privada participará mais da produção de riqueza e, com isso, serão novos contribuintes.
Um segundo mandato da petista mantém a dúvida: a máquina pública continuará sendo fortalecida, o que inclui a participação do estado, direta ou indiretamente, nas mais variadas atividades econômicas (especialmente na área de infraestrutura)? Ou, por convicção ou necessidade, serão abertas à iniciativa privada novas áreas de atuação?
Reforma tributária:
A reforma tributária não tem vida própria, não é uma medida de per si. Ela depende de inúmeras outras questões, como o pacto federativo, a reforma política e a reforma fiscal. Por esse motivo, a implementação da reforma tributária que exige mudança no texto constitucional é muito pouco provável – apesar dos discursos e das promessas de campanha.
Pode acontecer, como vem acontecendo, alterações pontuais, às vezes cirúrgicas, na legislação tributária. Também têm surgido raras iniciativas conjuntas entre interessados, como o caso das soluções propostas à guerra fiscal. Tais alterações dependem dos fatores acima mencionados e um governante afeito ao diálogo e bastante conciliador.